Quando a gente desenhava o mundo
nas aulas de geografia, pintando os mapas com canetinhas coloridas tudo parecia
ter outra dimensão. Dividíamos a América do Sul, cortando o Chile em pedaços. A Argentina
ganhava um naco a mais, compensando que errávamos o traçado do Paraguai e da
Bolívia invadindo seu território. O Suriname ficava perdido no meio das Guianas
e a Venezuela, (bem antes dos planos mirabolantes do falecido Hugo Chávez) às
vezes tomava até Trinidad e Tobago adentrando o mar e quase sempre, roubava-se
partes da Colômbia. Invertíamos a localização de Honduras com Nicarágua,
aumentávamos o território Canadense em cima dos Estados Unidos e esquecíamo-nos
de marcar a divisa com o Alasca.
Na Ásia, da Turquia a exótica
Índia, tudo parecia pertencer a outro planeta, com exceção da hoje Federação
Russa que ainda se chamava (e era ultra poderosa) União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas. Misturávamos acidentalmente Filipinas com Indonésia. Enrolávamo-nos
completamente na Oceania, tirando Austrália e Nova Zelândia, tudo era
Polinésia. Contudo aumentávamos propositalmente o Japão, porque a terra dos
lendários samurais não poderia ser tão pequenininha. No continente Europeu os
laços de muitos de nossos ancestrais tornavam tudo mais fácil. Sempre tínhamos
em sala de aula descendentes de italianos, poloneses, espanhóis, suecos ou
alemães. Já da Antártida a folha em branco aludia ao gelo. Da mãe África não
raro a turma mostrava cisão momentânea. Alguns dos nossos provinham de lares
cujos pais infelizmente eram preconceituosos e não raro incentivam seus filhos
a continuarem a sê-lo. Madagascar não era tão popular antes dos filmes da
Disney. Do Marrocos a África do Sul a dificuldade não consistia em decorar a
pronúncia de nomes, mas a divisão de territórios permanentemente em guerras
tribais, geralmente impulsionadas por grupos europeus inescrupulosos! Todavia
estávamos no (agora) Ensino Fundamental e a professora (que ainda não era
chamada de Tia) relevava nossos erros carinhosamente, apoiando-nos a corrigir e
reiniciar com mais entusiasmo.
Nem vou me estender aquém,
especificando o problema do salário defasado do Professor ou transporte escolar
para as crianças do campo, etc e tal. Meu objetivo nesse artigo é tecer olhar
de admiração (saudosismo e até pontinha de inveja), mesclado à satisfação de
acompanhar a evolução do estudo da geografia. Concorde comigo: hoje é super
fantástico viajar pelo mapa mundi sem sair do lugar, com a sensação de quase
estar presente fisicamente. E nem vou ficar atrelada ao Google Earth,
disponível para usuários domésticos, programa desenvolvido pela empresa
Keyhole, Inc. intitulado Earth Viewer, comprado pela Google em 2004, que visualiza imagens de diversos satélites (e da NASA),
mostrando-nos detalhadamente cidades, relevos, construções em 3D, até as
galáxias no espaço. Refiro-me aos livros de história e geografia, aos programas
de televisão, aos sites de pesquisas, as revistas e jornais que ao abordarem
assuntos diversos, acrescentam dados estatísticos e geográficos multicoloridos.
Assombra-nos a velocidade da
informação, o cruzamento de dados das áreas diversas e as múltiplas
possibilidades do professor poder desenvolver tudo isso em sala de aula. Então
aquelas nossas cartolinas amassadas, as canetas que respingavam tinta no
uniforme, os livros de cores esmaecidas e o sofrível mapa da parede ao lado do
quadro negro, que continha alguns erros similares aos que cometíamos
inocentemente ficaram para trás. Quando nossa geração desenhava o mundo, a
verdadeira dimensão do planeta infelizmente ainda era restrita. Hoje se
descortina a extensão do mundo fascinantemente diante dos nossos olhos e num
piscar de olhos!
Régis Mubarak